Todos
os estados brasileiros mais o Distrito Federal registraram aumento no número de
domicílios que pediram auxílio emergencial ao governo em julho por causa da
pandemia, de acordo com Maria Lúcia Vieira, coordenadora da pesquisa Pnad
Covid-19 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, esse dado mostra que o programa
continua beneficiando a população mais pobre, a mais afetada pela crise causada
pela pandemia, e que sua interrupção ou diminuição traria impacto especialmente
aos mais vulneráveis. Os economistas ainda apontam que o benefício vem ajudando
a aquecer a economia e incentivando o consumo, mesmo em um momento ainda
delicado, com piora constante no mercado de trabalho. O desemprego chegou a
13,1% em julho.
Para Daniel Duque, pesquisador do FGV-Ibre, não seria possível impedir uma
queda grande na renda dos mais pobres com eventuais mudanças no benefício.
Segundo ele, o terço mais pobre da população seria especialmente afetado.
"Estamos longe da situação pré-pandemia e, mesmo se saísse uma vacina
[para a Covid-19] amanhã, não teríamos essa recuperação", analisou o
pesquisador. Ele definiu o auxílio como "um programa relevante" para
a população mais pobre e um sustentáculo, ainda que provisório, para a
recuperação do comércio. Segundo o IBGE, em todo o país, o valor médio do
benefício chegou a R$ 896 por domicílio.
Em alguns locais, a proporção de domicílios beneficiados pelo auxílio
emergencial supera a marca dos 60%. Isso acontece no Amapá (68,8%), Maranhão
(65,8%), Pará (64,5%), Alagoas (62,8%), Amazonas (62,8%) e Piauí (61,7%). Já em
outros, é menos da metade desses estados, como em Santa Catarina (24,5%) e Rio
Grande do Sul (29,6%).
Na última terça (18), a reportagem mostrou que o governo estuda usar uma MP
(Medida Provisória) para prorrogar o auxílio emergencial com valor abaixo dos
atuais R$ 600. O ministro Paulo Guedes (Economia) sempre defendeu um valor de
R$ 200 porque essa é a média aproximada do pagamento do Bolsa Família, mas
auxiliares do governo contam com parcelas de R$ 300 e a possibilidade dos
pagamentos até dezembro. Já nesta quarta (19), o presidente Jair Bolsonaro (sem
partido) indicou que o governo deve ampliar o auxílio emergencial até o final
do ano em pagamentos inferiores aos atuais R$ 600, mas adiantou que considera
baixo o valor de R$ 200 mensais.
Diante do cenário de incerteza, o professor da UFRJ João Luiz Maurity Saboia
acredita que o Brasil atualmente não tem como realizar um corte abrupto no
benefício. "O governo não tem a menor condição de acabar com esse auxílio
de uma vez. E é importante que o benefício não seja eliminado rapidamente, que
continue por alguns meses", apontou o professor.
Para Ricardo Macedo, professor do Ibmec, a situação vem obrigando as pessoas a
procurarem emprego novamente, pressionando a taxa de desemprego - a Pnad
Covid-19 apontou alta de 2,1 milhões de pessoas na fila por trabalho, entre
maio e junho, em meio à pandemia. "É possível que lá na frente com
relaxamento cada vez maior a gente verifique maior pressão sobre a taxa de
desemprego", analisou Macedo. Em julho, segundo dados da Pnad Covid, a
taxa de desocupação subiu de 12,4% para 13,1%, atingindo 12,3 milhões de
pessoas, o que representa um acréscimo de 438 mil pessoas a mais desempregadas
desde junho. Em maio, eram 10,1 milhões procurando trabalho.
"O
cenário é muito ruim e se não tiver prorrogação do auxílio piora", emendou
o professor do Ibmec. Ele chamou a atenção para o dado de 44% dos domicílios do
país utilizando o benefício em meio à pandemia, número que vem crescendo a cada
mês. "Isso é espantoso, indica que a disseminação do auxílio é fantástica
no país e mostra a importância para as pessoas sem renda ou com queda muito
grande na renda", analisou Maurity Saboia.
O
presidente Jair Bolsonaro defende um "meio-termo" para o benefício e
uma redução gradual dos valores, uma medida que técnicos chamam de
"desmame" do programa. Eles ressaltam, no entanto, que ainda não há
definição sobre o valor.
Para Otto Nogami, economista do Insper, o auxílio está sendo importante em um
processo de sinalização de retomada econômica do Brasil, porque muita gente não
precisaria do auxílio, mas está recebendo e gastando em supérfluos, reformando
a casa e trocando imobiliária, entre outros fatores. "Com uma eventual
redução do auxílio emergencial e mesmo a parada do oferecimento do benefício,
aí sim sentiríamos o que efetivamente está acontecendo na economia",
apontou Nogami.
Ele também alertou que o prolongamento do benefício por muito tempo pode afetar
o mercado de trabalho de maneira negativa, incentivando as pessoas a desistirem
de procurar emprego para viver da renda do benefício. "Tem que tomar
cuidado com esse tipo de programa, não é só conceder o benefício e sim ter
medidas de política econômica capazes de incrementar o potencial de renda em
todas as regiões do país", definiu.
A lei que rege o auxílio emergencial define que o benefício pode ser prorrogado
atualmente por ato do Executivo sem a necessidade de validação do Congresso,
desde que seja mantido o valor de R$ 600 (já que esse é o valor previsto no
texto).
Informações:
Folha de Pernambuco
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